Nenhuma criança nasce machista

Nenhuma criança nasce machista

Toda mulher tem uma história de assédio pra contar. Várias, inclusive, estão sofrendo algum tipo de agressão ou assédio no exato momento em que escrevo esse texto. Eu estava há cinco minutos atrás respondendo um comentário extremamente machista no facebook. Isso é mais comum do que poderíamos esperar que fosse em plenos anos 2017 mas, essa semana, o machismo virou calamidade pública e não dava pra não se posicionar a respeito disso.

A escritora Clara Averbuck foi assediada, estuprada e agredida por um motorista de Uber. Uma moça foi assediada e agredida em um ônibus por um homem que ejaculou em seu pescoço e mais: o sujeito, já acusado de 5 estupros, foi liberado por um juiz que entendeu que não houve constrangimento, tampouco violência ou grave ameaça (sic). Pois é. Ontem, li o relato de uma moça que viralizou falando ser perseguida e ameaçada por um rapaz há 8 anos, pessoas defenderam o homem, culparam sua mãe e até o presente momento ele continua solto.

São três casos específicos que ganharam notoriedade por conta das redes sociais. Mas sabemos que o machismo existe no nosso cotidiano a ponto de nós, mulheres, tão somente por existirmos, vivermos na defensiva o tempo inteiro, fechamos nossos corpos da maneira como podemos, nos encolhemos, acordamos e dormimos com o medo. Só nós, repito: só nós sabemos o que passamos. Os tempos modernos não trouxeram os carros voadores nem o teletransporte, mas sim muitos (mesmo!) homens que vieram ao mundo no tempo errado. A época que lhes cabia era a pré-história.

Pode ser utopia, esperança exagerada, ou simplesmente a minha fé materna que me diz que isso vai mudar. Talvez, quando minha filha tiver minha idade, tudo esteja diferente e melhor. Mas não dá pra ficarmos só no desejo e nas orações. O combate ao machismo precisa urgentemente ser inserido na educação de nossas crianças.

Cuidadores de meninos (leia-se: mães, pais, tias, tios e todos que fazem parte da vida da criança) vocês têm um papel fundamental na mudança do mundo. Isso mesmo. Por favor, ensinem os seus filhos a não serem machistas. Desconstruam-se para que seus filhos aprendam a não replicar o machismo ao qual nossa geração foi condicionada. É de suma importância que comece de casa, se estenda nas escolas, se espalhe pelo universo inteiro.

Permitam que seus filhos brinquem com os afazeres domésticos, com a cozinha, com as bonecas. Deleguem a eles atividades que melhorem sua vida como um todo. Limpar ou organizar qualquer coisa com excelência não é característica de mulher. Fomos ensinadas a isso. Por que não ensinarmos aos meninos também?

Chega desse preconceito e dessa masculinidade tão frágil que grita para ser provada a todo custo, toda hora. Não é pra achar bonito que seu filho tenha "várias namoradinhas", ao invés disso, ensine-o a ter carinho e respeito com as pessoas. Não é pra achar legal que seu filho se interesse exclusivamente por carros, futebol e outras "funções de menino", ao invés disso, ensine-o a ter domínio sobre si mesmo pra que melhor ele possa escolher o que quer ser depois.

Deixa ser bailarino, deixa ser pai das bonecas, deixa brincar de comidinha, de casinha, deixa ser livre. Deixa gostar da cor que quiser. Não vamos permitir que fabriquem novos machistas. Ninguém nasce machista, mas esse é um comportamento tão institucionalizado que é difícil ou impossível achar um homem que não tenha traços do machismo que lhe foi ensinado desde cedo.

Eu não deixo de sonhar com um mundo melhor, sério. Quando esses pequenos forem adultos, se seguirmos firmes nessa batalha da desconstrução, teremos, sem dúvida menos assédios, menos mulheres agredidas, melhores pais, menos mães sobrecarregadas (e olha, garanto que com mães menos sobrecarregadas o mundo inteiro ganha).

Depende totalmente de nós que nossas crianças sejam a melhor geração que o mundo já testemunhou existir. Se você ensinar ao seu filho/sobrinho/neto/criança amada a combater o machismo, eu não vou precisar ensinar minha filha a, todo instante, se defender.

As imagens que ilustram esse texto são de uma ilustradora incrível chamada Marcella Briotto (clique aqui para conhecer melhor o trabalho dela), feitas especialmente para o projeto "Educar para Crescer".

RECOMENDO: assistir ao documentário "The Mask You Live In", no Netflix.

 

Por Vitoria de Melo Bispo

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