Desde o dia em que descobri que seria mãe, intuí (leia-se: torci muito) que fosse de um menino. “Menino dá menos trabalho”, cresci ouvindo. “Ih, é menina? Vai pagar os pecados do pai”, alguns dizem. Nesse momento, me peguei desejando inconsciente algo que me foi incutido e reproduzindo um discurso covarde, que escondia o real motivo de desejar criar um homem: se ser mulher já é tão difícil, criar uma mulher deve ser muito foda.
Ainda no consultório onde descobri o sexo, veio a aceitação. Aí, meu amigo, se já era feminista arengueira, decidi que, se preciso, eu seria insuportável. Se já criava climão em qualquer conversa machista pra defender mulher, eu agora lutaria por mais uma. Ninguém menos que minha filha.
Saí do exame feliz, de peito aberto, bucho empinado. Pensando o quão poderemos revolucionar o mundo juntas. Até hoje ainda não sei se ensino mais ou se aprendo. Repito incansavelmente todos os dias o quanto ela é linda, esperta e forte. Enquanto digo, também absorvo. Preciso que ela crie asas e, até quando puder, serei o vento embaixo delas.
Não precisa ser princesa. Precisa ter coragem para ser o que quiser. É um pouco mais complicado, mas bem mais libertador, garanto.
Você pode ser até uma miss, filha
Aí, vem ator global com assédio, justo quando, há cinco meses, eu pago dobrado o boleto dessa briga. Claro que todo mundo tem que falar sobre. Isso mesmo, estou aqui para engrossar o caldo. Tem que expor, não calar, inspirar outras a saírem do armário do medo. Denunciar.
Por favor, não tenha vergonha, faça vergonha.
Susllem, minha querida, muito obrigada. Graças a você, pessoas muito vistas vestiram a camisa da nossa causa tão castigada, mas jamais entregue. Graças a você, hoje mais ouvidos escutarão nossos gritos. Seguiremos lutando todos os dias, na esquina de casa, no trabalho, nas festas, na vida. Um dia, eles não mais existirão. Um dia, eles não mais serão transmitidos em novelas das oito.
Com todo esse absurdo, descobrimos também que José Mayer esses vários anos foi esse ator tão limitado- sempre o mesmo garanhão machista- porque esteve interpretando o tempo inteiro ele mesmo. Agora tudo faz sentido.
Foi mal, bonitão. Curte a geladeira da globo e agradece por não terem te mandado direto pra bem longe ou pra Record. Deixa que a mulherada assume o seu papel de protagonista e, olha, somos dignas de Oscar. No quesito "variação de personagem", te garanto: você já perdeu desde o primeiro trabalho.
#chegadeassédio