Filhos: sua herança no mundo

Filhos: sua herança no mundo

Tudo começou com um post sobre ideologia de gênero. Rosa pra cá, azul pra lá, tornou-se impossível encontrar um meio termo entre as pessoas com opiniões diferentes. Até que uma mãe se impacientou com a ideia do filho brincando de boneca e arrematou: “crie seus filhos do seu jeito e eu crio meus filhos do meu.”

É inegável. Esse é um dos grandes clichês de que alguns lançam mão quando se discute a respeito da educação de uma criança, principalmente se o assunto por algum motivo aborda a possível orientação sexual da mesma: faça do seu jeito que eu faço do meu.

Acontece que nós não criamos nossos filhos sós: eles são educados por todo um contexto que os cerca. Mais importante ainda, não criamos filhos para nós mesmos: filhos são a nossa herança pro mundo. Ao tornarem-se adultos, eles participam mais ativamente da sociedade e lá fazem parte de um movimento que deveria ser em prol de tornar esse mundo melhor.

Se você cria meninas que desde cedo aprendem que o lugar delas é na cozinha e meninos que só podem usar roupas azuis, você não percebe, mas está criando pessoas com pouquíssima visão. E, desculpa o spoiler, mas isso não afeta em nada a orientação sexual dessa criança. A vida seria tão mais simples, não? Tantas vidas seriam poupadas se para deixar de ser gay fosse só brincar de carrinho/boneca!

Você tem todo direito de criar seus filhos dentro de valores nos quais acredita. Mas não dá mais para formarmos pessoas intolerantes e com conceitos rasos de aceitação: o mundo já está lotado delas. Ao ter filhos, você tem um compromisso enorme com toda a sociedade. Não é só uma questão de perpetuar nossa espécie, é uma questão de provocarmos mudanças reais no mundo com o que fazemos dentro de nossas casas.

Está nas suas mãos o enorme poder (e responsabilidade) de contribuir com um mundo mais tolerante, mais humano e pacífico. Não existirá em tempo algum ferramenta mais poderosa que crianças para alcançarmos esse fim.

Fica sendo então, de sua inteira responsabilidade, criar meninas empoderadas. Que saibam que podem ser absolutamente tudo que quiserem, inclusive bibelôs de marido. Que não precisam em tempo algum ter filhos ou casar para validarem suas existências. Que explorem sua sexualidade de forma livre e saudável, andando pelas ruas com qualquer traje e sem medo. Ao criar meninas assim, você permite que tenham escolhas e que sejam fortes, não se contentando com nada que não seja um cenário mais justo para elas.

Se você tem meninos, a sua responsabilidade é dobrada. Triplicada, pois o seu trabalho será essencialmente de desconstrução. Fica nas suas mãos o dever de tornar aquele futuro homem alguém que respeita limites. Que entende que pai é tão responsável quanto mãe. Que homens e mulheres são muito diferentes, mas perante a lei e a sociedade todos devem gozar dos exatos mesmos direitos e oportunidades. Que possuem todo direito de expressar sentimentos e fraquezas, pois homem também chora e não tem carrinho nem roupa azul no mundo que mude isso. Criando meninos assim, você diminui os índices de estupro, feminicídio, cantadas infames na rua e forma ótimos pais para seus futuros netos.

Caso você ache tudo isso um absurdo, eu lamento. Lamento bastante. Lamento primeiramente por você, que recebeu essa educação limitada dos seus pais. Lamento que você não entenda que essa forma de ver a vida tão conservadora é que o atrasa esse mundo e afasta pessoas. E lamento pelos seus filhos, principalmente.

Não pense que você pode vomitar seus preconceitos em cima de seres tão livres: crianças. Não pense que o que você faz dentro da sua casa não impacta fora dela. Crie seus filhos para todos, não só para você. Crie seus filhos para serem felizes - e não há felicidade genuína na intolerância, há apenas ódio.

Filho é ferramenta. Use-a ao favor de um mundo melhor. Estamos precisando, desesperadamente.

Naira Oliveira escreve todos os minutos do dia. No trânsito, no mar esperando onda, amamentando o Axel. Vez por outra ela senta e digita suas ideias. É celebrante de casamentos em um projeto pessoal que chamou de Mar de Afeto. Acredita na desconstrução de ideias obsoletas da nossa sociedade e deseja fazer parte desse movimento.

Por Naira Oliveira

Voltar para o blog

Deixe um comentário